sábado, 25 de fevereiro de 2012

As horas que vivemos aqui

“Veja bem, meu bem, sinto te informar que arranjei alguém pra me confortar...” “Veja bem meu bem”, Los Hermanos.

Obrigado pelo presente da presença. Obrigado pelas palavras, pelo sabor, pelo desejo, pelas marcas. Estou feliz, pois experimentei com você mais uma vez aquilo que ninguém ainda conseguiu dar nome, nem nós mesmos.
Mas chega um momento, e como eu não sei, em que preciso parar pra respirar. Não consigo fazer tanta coisa ao mesmo tempo. Preciso voltar para o escuro da minha caverna e pensar sobre mim, voltar-me para dentro de mim. O amor me distrai e a distração prolongada me desliga de tudo, principalmente de mim mesmo. Sou um estranho narcisista.
Contudo, quero prolongar nossas horas, esse tempo que ficamos juntos. Você é minha promessa de bem estar. É uma promessa já cumprida. Mas preciso voltar aos delírios que borbulham dentro de mim. Minha amante é a solidão, e não desistirei dela, assim como não desisto de você.

“E eu nunca vou te esquecer, amor... Mas a solidão deixa o coração nesse leva e traz.”

Nós vivemos um triângulo amoroso. Você, eu e a solidão.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Não entre na floresta

Há algo bem no profundo, bem no limite, que não alcançamos, não conseguimos tocar, mas sentimos sua força, sua influência. Sentimos nossa própria essência, nosso fundamento, como algo que não fosse nosso, algo autônomo, que tivesse vida própria, como se pudesse sair de nós de dizer “sei sobre você mais do que você mesmo sabe”.
Se pudesse tocar essa coisa, talvez pudesse resolver algumas confusões. Preciso organizar novamente alguns arquivos, está tudo tão desorganizado, tão perdido... Há trevas, há sujeira em tudo.
Mas isso é como o clima de “A Vila”. Há uma tensão inerente a tudo, em cada passo. Há um medo disso que não se vê e não se conhece.  Há uma voz que diz: Não entre na floresta, é onde eles moram.
Preciso voltar a fazer análise. Oh, céus, como eu preciso.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

O egoísmo de Martha

Espelho, espelho meu, existe alguém mais egoísta do que eu?
(...)
Meu egoísmo é revelar só um pedaço do que sou, só a parte boa, a mocinha da história. Tenho, dentro de mim, um elenco de coadjuvantes que não deixo que brilhem, que não dão autógrafos nem saem nas capas de revista. Egoísta. Poupando o mundo do meu lado sórdido, que costuma ser o mais interessante.
São os meus sonhos eróticos, meus os momentos de isolamento, são meus os devaneios, minhas as omissões. Os disfarces são meus, a boa mãe que sou em termos, a esposa perfeita que mais ou menos, a amiga leal que nem tanto. Não faço maldades, não prejudico ninguém, mas não me dou inteira.
(...)
Egoísta. Guardo para mim as palavras que não me atrevi a pronunciar, os planos descartados e os fetos de mim mesma que abortei. Poupei os outros do meu lado mais cruel e impactante, o meu lado mais insano e fascinante. Tenho tudo o que quis, tenho mais do que planejei, e mesmo assim – egoísta! – mal vejo a hora de recomeçar. Não sei se nasci para desempenhar o papel que me foi reservado. Tenho um bom currículo e alguns bens, mas o que é mais meu, minha maior propriedade, nunca foi declarada, minha loucura ninguém sabe onde mora, minha fé nem eu mesma sei onde se esconde.

“Divã”, de Martha Medeiros.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Paixão e confusão

Recorro às palavras escritas quando as faladas não vêm. Elas quase nunca vêm. Preciso escrever o que não consigo dizer, ou o que não posso.
Você ficou decepcionado, eu sei. Sou egoísta, mas também distraído. Não tinha me dado conta de que minha presença era tão importante assim. A questão é que você não me vê como eu te vejo. Você não me quer como eu te quero. E depois de tanto tempo remoendo isso, resolvi me afastar. Alguém me disse que estou confundindo as coisas. Mas como não confundir as coisas quando elas estão todas ligadas ou imersas nisso que se chama paixão?
E agora essa situação chata, desagradável. Deveria ficar feliz em perceber que sua decepção o afasta de mim. Mas eu não tenho jeito, eu fico triste por ter decepcionado você. Um livro de presente pode resolver essa situação? Não sei, talvez resolva. Mas não há livro de auto-ajuda no mundo que resolva o problema do amor.