domingo, 25 de julho de 2010

Turbilhão


"It's gonna be... It's gonna be over..." "Call my name", Morgan Page.


Seis e cinqüenta da manhã, a correria de sempre. Não adianta. Eu sempre estarei atrasado. O interfone toca, só para me irritar. “Sou, eu, filhote. Desça para conversarmos.” Não acredito...
Desci mas não parei, seguimos para o ponto de ônibus. Não adianta conversar, não seja cínico. Nunca foi fácil conversar com você. Nunca foi fácil lidar com você. Não venha bancar o correto, agora. Ameaças, grosserias, rancor. “Vamos pegar qual ônibus?” Vamos? Tchau, pai. Depois, a culpa. Não havia necessidade daquilo. Por que fiz aquilo? Apesar de você ser um filho-da-puta, você não mereceu isso. Nem vi seu rosto. Apesar de não querer vê-lo, eu te amo. Perdoe-me. Repito: não vi seu rosto...

Isso aqui se tornou uma verdadeira terapia. Aliás, uma catarse. Um escape. Não consigo pensar em minha vida sem esse espaço, que me ajudou a colocar tanta coisa para fora... Mas agora vejo que ele é um erro. Ao mesmo tempo em que esse espaço expõe a racionaliza a coisa, ele a diminui. O que faço aqui não é resolver minhas questões, é desviá-las de seu caminho. Ainda estou às voltas com essas questões. Eu não saí da casa do medo, o medo ainda me domina. Isso aqui é apenas um desvio, um disfarce. É pura aparência, um engano, uma falsa sensação de que as coisas estão ‘se resolvendo’. E não estão.

“Semana que vem é nossa última sessão.” Triste, eu sorri. Então você vai embora mesmo, não é? Sabia que esse momento ia chegar. Parece que você quer logo se livrar de mim, às vezes tenho a sensação de que você está de saco cheio de mim.
Sim, eu sou um chato, mesmo. Eu não quero parar agora. Eu quero continuar. Sinto que ainda não estou pronto. Será que algum dia estarei pronto? Ainda tenho muito a dizer, ainda há muito a descobrir. Sei que há coisas terríveis dentro de mim. Fale alguma coisa. Fale alguma coisa, merda. Quando nos despedimos, eu tive vontade de chorar. Mas segurei o choro. Não queria me sentir mais patético do que já me sentia.

Durante esses dias, muitas pessoas me observavam. “Ah, é você?” “Ah, é ele?” Eu sentia um clima diferente. Olhares de admiração, respeito, outros de timidez, outros de indiferença. E olhares lascivos. E a surpresa. Uma surpresa esperada, mas que por isso não deixou de ser surpresa. Ainda estou extasiado. “Você, tão quietinho, tímido, na sua, já produzindo tudo isso. Parabéns.”
De frente ao espelho, trêmulo. Meu deus, vou ter um infarto. Não consigo parar de tremer. Estou muito nervoso. Estou feliz, até demais. Percebi alguns olhares, uns toques. Respiro fundo. Preciso beijar você agora. “Mas aqui, no banheiro?” Sim, preciso fazer isso, por favor. Estou falando sério. Correr um risco maior do que o anterior vai solapar esse nervosismo momentâneo. Que maluquice, a minha.

Eu preciso aprender a lidar comigo mesmo. Preciso acreditar em mim mesmo. Preciso saber quem eu realmente sou.

5 comentários:

  1. "Repito: não vi seu rosto..."
    Às vezes penso ter uma cegueira momentânea para rostos também... Ótimo texto!

    ResponderExcluir
  2. muito bom o texto!!
    http://naosentindo.blogspot.com/

    ResponderExcluir
  3. Um turbilhão mesmo. Nem sei o que dizer.

    ResponderExcluir
  4. eu fiquei aqui pensando em toda a confusão em todo loucura e amei o teu perfil puritanismo com libertinagem

    todos deveriam ser assim
    estou concorrendo ao VI Eu tenho um blog(da comunidade Eu Tenho um Blog) na categoria Literatura, se achar que mereço vai lá na comu e vota em mim, grande abraços

    ResponderExcluir