sábado, 12 de março de 2011

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“... é um local de descarrego, a oportunidade de se livrar da raiva, do fel, do desprezo, mas também de exibir o ego, de praticar o narcisismo. Também de se praticar aquilo que não se é (...), de endossar um disfarce, como as crianças, que permita argumentar a não realização do mundo real em favor de um universo virtual que não obedece outra lei senão a do capricho pessoal (...). Um gênero de ‘cloaca máxima’ como existia na Roma antiga para drenar o esgoto, um canal destinado a conduzir as imundices de uma sociedade (...).” Michel Onfray, filósofo francês, sobre as mídias sociais.

Nessa semana refleti sobre minha vida virtual. E sobre a efemeridade das relações, sejam elas virtuais ou não.
Depois de muitos problemas – alguns graves – relacionados ao uso de redes sociais na Internet (Orkut, Facebook, Twitter e esse bendito blog), dei-me conta de como nos expomos para os outros e de como esse narcisismo inflado pode nos trazer prejuízos quase irreversíveis.
Qualquer comentário bobo e fútil torna-se importante, precisamos divulgá-lo. Qualquer foto é peculiar, precisamos expô-la. Precisamos mostrar que saímos à noite, que bebemos, que dançamos, que somos cultos, bonitos, ricos e felizes. Precisamos avisar que vamos ao banheiro, que não gostamos do último filme com a Natalie Portman e que a música nova da Lady Gaga é uma cópia descarada de uma música da Madonna. Precisamos descarregar nossa raiva, xingando e ofendendo deus e o resto do mundo.
O que há de comum em todas essas exposições desnecessárias? O que há de comum em todo esse lixo virtual? A grande maioria das coisas que publicamos na rede é exposta por impulso. Nossas fotos são publicadas por impulso, nossas palavras são postadas por impulso. Nossa vida em rede é um impulso. E por ser um impulso não nos diz tanto respeito. O personagem que aparece nesse blog, por exemplo, é só uma parte – por vezes grotesca – de mim.
A partir dessas reflexões, percebi que há muito tempo eu estava me expondo demais e tornando explícitas coisas que não queria explicitar. Percebi que muitos estão me acompanhando, me seguindo, me espreitando, em silêncio. Pessoas não necessariamente indesejáveis, mas que estão próximas de algumas que o são. Em relação aos contatos, os chamados “amigos”, pensei que ter o máximo possível de contatos seria uma vantagem, pois assim seria mais difícil perder contato com as pessoas que gosto mas que estão longe. Isso faz sentido, mas há um alto preço a pagar: a exposição a nível exponencial. Somos celebridades dos nossos amigos virtuais. Eles são nossos paparazzi. Quanto mais pessoas, mais exposição. E isso, na minha situação, é desnecessário, é ruim. O prejuízo decorrente da exposição não compensa o prazer de se expor. Eu percebi que, se uma amizade quer se preservar, ela se preserva e ponto; não há necessidade de forçar o estabelecimento e a manutenção de um contato virtual. O laço afetivo precisa ocorrer naturalmente, mesmo que seja por meio virtual.
Com base nisso tudo, tomei a decisão de me limitar ao uso das redes – me reservar à condição de expectador – e excluir alguns contatos. Pessoas que não precisam e nem devem saber do que acontece na minha vida. Só não excluirei o blog, por enquanto, porque esse espaço ainda é muito importante e, por isso, indispensável. Ainda preciso escrever. E de qualquer forma sempre precisamos exercitar um pouquinho nosso narcisismo.

Para terminar, dou-me a liberdade de praticar apenas mais uma vez a exposição desnecessária citando algumas palavras que ouvi há alguns dias e que agora fazem muito sentido para mim: “Quando seus parentes começam a te adicionar em alguma rede virtual, é sinal de que essa rede já está ultrapassada.”

#fikdik

Um comentário:

  1. Boa reflexão. Eu acho que muitos exageram mesmo nessa exposição. Põem pra todo mundo ver fotos e momentos "particulares". Mas cada um sabe o que lhe faz bem. Só acho também que toda exposição tem suas consequências, cabe a cada um decidir se vale a pena pagar o preço.

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