quinta-feira, 1 de abril de 2010

Um país de idiotas

Apesar de não ter tempo nem paciência para acompanhar o BBB 10, fiz questão de me inteirar da atuação de alguns participantes e assistir a última eliminatória, a que deu ao participante Dourado o grande prêmio de 1,5 milhão.
Durante essa edição do programa, houve uma verdadeira batalha virtual. De um lado, pessoas ligadas ao movimento LGBT, ou apenas simpatizantes, postavam, em centenas de páginas e blogs, mensagens defendendo a eliminação do ‘homofóbico’ Dourado; de outro, pessoas que defendiam sua franqueza, atitude e honra. Segundo o que ouvi por aí, Dourado foi o vencedor por ter sido ele mesmo durante o jogo, por ter sido franco, ainda que grosseiramente franco. Só por isso?
Dourado foi homofóbico ou não? Talvez o termo homofobia, por sua etimologia e seu forte uso político, seja inadequado para definir a postura do participante. Além disso – e aqui entra o X da questão –, as coisas que ele fez e disse, que muitos chamam de homofobia, não são encaradas como tal. Dizer coisas como “tenho nojo de ver dois homens se beijando” não são vistas como manifestação de preconceito. O que não significa que elas não sejam. As afirmações homofóbicas de Dourado foram sutis. Em nenhum momento ele disse “odeio gays” (e nem acredito que ele odeie); o preconceito se manifestou de forma bastante tangencial, em atitudes, olhares, gestos e afirmações como “heterossexuais não contraem AIDS”. Um preconceito implícito, o mesmo praticado por grande parte da população que o elegeu seu herói.
Alegar que a postura do participante não é preconceituosa é olhar para essa questão de dentro da norma, mais especificamente, de dentro da heteronormatividade. Alguns podem dizer que ele só não queria ser confundido com um homossexual. Se isso não é preconceito, então não sei o que é. Por que tememos ser confundidos com homossexuais? O que está por trás disso? Outros podem dizer que sua afirmativa de que heterossexuais não contraem AIDS não foi preconceituosa porque se baseou na informação de outra pessoa, no caso, um médico. Argumento que também não se sustenta, pois ele fez uso de uma informação (falsa) para reafirmar uma postura preconceituosa. Ele não reprovou a relação homossexual porque ela contrai AIDS; ‘essa relação contrai AIDS’ é um dado que serve para reafirmar sua reprovação, que é pré-existente, anterior ao dado. O preconceito, como o próprio nome sugere, vem antes da informação.
O que é mais lamentável não é a vitória de Dourado, mas sim o que isso representa. Na avaliação do público, a homofobia foi minimizada ou descartada. Não teve peso nos votos. Dourado foi sincero, sempre dizia o que pensava. Tinha atitude. Isso é louvável. E foi isso que o tornou o favorito. Mas seu preconceito em relação aos homossexuais não foi importante. Dessa forma, o público aprovou, legitimou, o preconceito contra os gays. Se ele tivesse feito declarações igualmente sutis em relação aos negros, por exemplo, ele seria a bola da vez? Não. O preconceito de cor, ao contrário do preconceito sexual, é socialmente reprovável. Piada de ‘preto’ é engraçada? Não. Piada de ‘viado’ é engraçada? Sim. Este é um preconceito que ainda é aceito, valorizado e reproduzido no meio social. A vitória de Dourado é uma clara representação do modo de pensar brasileiro em relação à diversidade sexual: conservador, preconceituoso, discriminatório.
E não é só isso. A vitória de Dourado não é apenas a reafirmação da heteronormatividade e do preconceito sexual, mas também a reafirmação da supremacia masculina estereotipada e, conseqüentemente, a subjugação do feminino. Dourado é um reflexo daquilo que é imposto a todos na sociedade, tanto homens quanto mulheres: a valorização de um conjunto de características ditas masculinas, viris, ativas, ‘racionais’. É a reafirmação da hierarquia de gênero, tão desigual, dicotômica e fonte de violência.
Confesso que o resultado da última eliminatória do BBB é desanimador. Vivemos realmente em um país atrasado e estúpido. Um país de idiotas. Estamos a anos-luz de distância de uma sociedade brasileira que almeje, de verdade, a igualdade e o respeito às diferenças. Qual é a solução? Abandonar esse país de uma vez por todas?

Um comentário:

  1. Nem sempre as coisas são como queremos ou esperamos. Eu também me decepcionei com o programa e o resultado. Mas fazer o quê? Eu parei de assistir, pra não me estressar. Espero que o próximo venha com participantes mais maduros e educados. E eu prefiro acreditar que o país não é, em sua maioria, um país de preconceituosos. Preconceito muitas vezes é falta de informação, de contato. E a popularidade do Marcelo, na minha opinião, se deve à sua torcida organizada e fanática, e também porque este ano o peso das ligações e do voto da internet foi o mesmo. E a "máfia" usava de programinhas para multiplicar o número de votos. Bem, é uma suposição. Talvez seja uma visão otimista demais, rs. Mas o Brasil é ainda um país maravilhoso de se morar. E gente preconceituosa tem em todo lugar, cabe a nós sabermos lidar e tentar fazer alguma coisa pra mudar o pensamento das pessoas. Conscientização e informação.

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